sábado, 18 de março de 2017

O céu existe mesmo

As pessoas que me são mais próximas sabem que tenho ido todas as semanas, nem que seja por uma ou duas horas à antiga casa de minha mãe, recentemente falecida. Já já estive mais, mas foi logo ao início, ela fumava muito e a casa tem um cheiro terrível a tabaco que se entranhou em tudo. Tenho a pouco e pouco, arejado e lavado panos e almofada, e ainda há um montão de tanta coisa para lavar e colocar ao sol, para tirar o odor horrível.
Mesmo com o odor a tabaco, tudo e foram já muitos sacos, tudo o que coloco ao lado do contentor, alguém leva. Ainda bem, assim damos sem olhar a quem. Acredito que é assim que se deve dar.
Quem dá não precisa de reconhecimento se o fizer com o coração, mas há quem precise de ver a menção do seu nome nos agradecimentos, alguns até com valores em dinheiro, isso não é dádiva, é exibicionismo.
Tínhamos por vezes, mesmo ao telefone, acesas discussões sobre tudo e nada. Eu sou panteísta e à minha maneira acredito que um "Nirvana" é possível, mas a imagem de um céu redentor e um inferno castigador, não passa por mim. Até porque e apesar de educada na religião católica, ao chegar à adolescência e ter começado a ler tudo o que aparecia, e ter tido a sorte de ser orientada nas leituras, cheguei à conclusão que as religiões são todas invenção do homem, que alguns se basearam nas escrituras que alguém escreveu etc.
Em casa de minha mãe, ficava a imagem de Maria, todos os quinze dias e havia rezas de amigas etc.... era extremamente Mariana. Confesso, e não tenho problema em o admitir, quando era praticante da religião, também eu era mariana.

Minha mãe tinha grande desgosto do meu afastamento da religião e então eu dizia-lhe, não foi da religião que me afastei, porque aceito todas e respeito, foi da igreja.
Tanto pecado camuflado, tanta riqueza quando há tanta fome no mundo, tanta ignomínia que tenho vergonha de algum dia ter assistido e frequentado.
No entanto, eu própria procuro as igrejas vazias. Transmitem-me calma e acredito que seja pela corrente de fé que existe no local.
Mas tudo isto para vos dizer que, minha mãe andava a ler um livro, que é " O céu existe mesmo" ...ia na página 96, ou deixou-a marcada para mim. Mas pior, encontrei uma dedicatória escrita por ela " Será que agora acreditas G..."....escusado será dizer que estou a ler o livro e freneticamente.
Como pode uma criança que ainda nem quatro anos tem, dizer aquelas coisas, invenção??
Confesso que fiquei petrificada....ainda estou e, como vos disse no início de Fevereiro, estou a descobrir, sem a presença dela, uma outra pessoa, que era minha mãe e a quem todos amavam, amiga de tanta gente e que oferecia chocolates, chupas e bombons, às crianças e andava sempre com um saco de guloseimas para oferecer aos filhos e netos das amigas, e fazia coisas às amigas, picots nos paninhos de cozinha ou nas toalhas de pequeno almoço, que fazia tanta coisa a que pouco assisti...
Por tudo isso já vai em um mês e meio e pouco mexi na casa, têm sido estas coisas pequenas e cartas, escritos em envelopes etc que me prendem os olhos.

GR

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