Amor Pacífico e Fecundo
Não quero amor
que não saiba dominar-se,
desse, como vinho espumante,
que parte o copo e se entorna,
perdido num instante.
Dá-me esse amor fresco e puro
como a tua chuva,
que abençoa a terra sequiosa,
e enche as talhas do lar.
Amor que penetre até ao centro da vida,
e dali se estenda como seiva invisível,
até aos ramos da árvore da existência,
e faça nascer
as flores e os frutos.
Dá-me esse amor
que conserva tranquilo o coração,
na plenitude da paz!
Rabindranath Tagore, in "O Coração da Primavera"
Tradução de Manuel Simões
Encontrei este texto, devidamente creditado, sobre a sua vida e obra.
Não quero amor
que não saiba dominar-se,
desse, como vinho espumante,
que parte o copo e se entorna,
perdido num instante.
Dá-me esse amor fresco e puro
como a tua chuva,
que abençoa a terra sequiosa,
e enche as talhas do lar.
Amor que penetre até ao centro da vida,
e dali se estenda como seiva invisível,
até aos ramos da árvore da existência,
e faça nascer
as flores e os frutos.
Dá-me esse amor
que conserva tranquilo o coração,
na plenitude da paz!
Rabindranath Tagore, in "O Coração da Primavera"
Tradução de Manuel Simões
Encontrei este texto, devidamente creditado, sobre a sua vida e obra.
Rabindranath Tagore
1861-1941
1861-1941
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Nada,
nada havia na literatura lírica que se assemelhasse àqueles poemas de
inexcedível sensibilidade e beleza mística. Não se conhecia muito sobre o
autor, mas a verdade é que ali estava um livrinho, quase um folheto -
"Gitânjali", "A Oferenda Lírica" – que foi capaz de, por si só,
arrebatar às demais obras literárias classificadas pela Academia Sueca
ao Prêmio Nobel. E foi o que acabou por acontecer, a 13 de novembro de
1913, quase por unanimidade de votos. Depois o mundo literário veio, a
saber, que o "Gitânjali" era apenas uma amostra da produção, escrita em
bengali, do então desconhecido e mas já laureado hindu RABINDRANATH
TAGORE.
Naquela
época, uma nuvem escura envolvia nosso pobre planeta; uma atmosfera de
ódio e incompreensão pesava sobre a humanidade: corriam os dias da
primeira Grande Guerra Mundial. Mas, pela Divina Providência, mesmo nas
entranhas do inferno vão os anjos despertar os corações sofredores e
empedernidos, suavizando-os com o bálsamo do esclarecimento, a
mostrar-lhes o Caminho da Redenção... Assim, das margens do velho Ganges
ecoou para o Ocidente aquele canto suave, pleno de esperança, fé e
amor, como se o rio sagrado ampliasse seu leito até o infinito, fazendo
com que suas águas milagrosas passassem a lavar, também, o resto do
mundo, ao som do borbulhar macio de sua correnteza e da música dolente e
mística das flautas de bambu, tocadas às suas margens por devotos, em
busca de Brahma.
Tivessem
os responsáveis pelo sanguinolento conflito ouvido também aquele canto
oriental de Tagore e a guerra não se teria travada, dando a humanidade
gigantesco passo no caminho da evolução.
Os
candidatos recomendados ao Prêmio Nobel, todos do mais alto nível
intelectual, eram muitos naquele concurso, afigurando-se dificílima a
escolha, antes de surgir, quase ao acaso, aquela delicada poesia, cheia
de luz e encanto, há um tempo impetuosa e serena, vigorosa na fé e
profunda na sabedoria. Os países civilizados fizeram-se representar,
interessando-se alguns governos mais vivamente pelos respectivos
aspirantes do seu pais à glória máxima. Tagore, todavia, não chegou a
considerar seriamente as alusões que ouvia sobre suas possibilidades. Na
tarde daquele dia 13, regressava de uma excursão com seus discípulos,
quando foi abordado por um estafeta, que lhe entregou despacho urgente
de Estocolmo. O Mestre, distraído, colocou-o no bolso e continuou a
conversar com os alunos. Mas o funcionário do telégrafo insistiu em que o
telegrama fosse aberto naquele momento. Foi então que os discípulos,
jubilosos e emocionados, homenagearam seu Mestre, que, embaraçado na sua
humildade e apanhado de surpresa, explicava que a distinção era feita à
Índia e não a ele.
Tagore,
dali por diante, passou a ser lido e conhecido pelos ocidentais como
escritor de grandes méritos. Sua bagagem literária já era enorme àquela
altura. Mais tarde somaria, sem contar as escritas diretamente em
inglês, cerca de duzentas produções em língua bengali, entre poemas,
peças teatrais, contos, romances, ensaios, artigos e conferências,
girando sobre os mais diversos assuntos filosóficos, políticos,
econômicos, sociais e religiosos. Mas sua grande preferência são os
poemas sobre as belezas da natureza e sobre o amor. Até hoje ainda não
foi possível editar suas obras completamente. Grande parte delas ainda
permanece na língua original, o bengali, para ser traduzida.
Os
méritos de Tagore não se resumem, porém, na sua vasta obra literária;
ele realizou muito na sua elevada aspiração, sempre acima de
preconceitos religiosos e sociais, preparando algumas gerações de moços
para uma vida maior. Foi educador de milhares de jovens. Nele
sobressaía, ao lado do escritor, humanista e pintor, o educador emérito.
Em 1901 criou a famosa escola ao ar livre de "Shantiniketan", em
Belpur, Bengala. Ali iniciou importante experiência educacional,
observando linhas não convencionais de ensino. Mais tarde a escola veio a
se chamar "VisvaBhrati", com a divisa: "Yatra Viscam bhavati Eka-nidam"
(onde o mundo inteiro encontra seu ninho).
Como
13º filho do Maharshi Devendranath e neto do príncipe Dwarkanath
Tagore, Rabindranath nasceu em Calcutá, Índia, a 6 de maio de 1861. Em
sua terra natal deu os primeiros passos na educação escolar. Dotado de
espírito inquieto e turbulento, não chegou a ser o que se pode chamar de
excelente aluno na escola. Havia, para si um maior aproveitamento no
próprio lar paterno, onde se desenvolvia um clima de elevada cultura e
sadia religiosidade. Amava a natureza e revelava tendência contemplativa
em tudo, numa idade em que a criança pensa somente em folguedos. Seu
pai era respeitado como "Maharshi" (o santo) e fazia parte do movimento
Brahmo Samaj, que era contra as separações dos indivíduos por castas e
dava fé a doutrina do Karma e a reencarnação, iniciado em 1828 e que
vinha revolucionando a vida religiosa da Índia, principalmente nas
camadas mais cultas. Em 1839 Devendranath fundara o "Tatwabodhini
Sabha", entidade destinada a divulgar a verdadeira religião hindu. Como
se observa, Rabindranath nascera rodeado de um halo místico, que se
revelaria em sua obra e nos seus ensinos.
Aos
oito anos começou a transparecer nele a vocação poética. Sua primeira
viagem foi um verdadeiro encantamento: visitou os Himalaias em companhia
do pai. Em 1877 seguiu para a Inglaterra, a fim de estudar advocacia,
mas acabou por dar preferência a um curso de literatura inglesa, na
Universidade de Londres. Logo voltou à Índia, onde passou a escrever nos
jornais e revistas. Embora sem o diploma universitário (um dos únicos
ganhadores do Prêmio Nobel de Literatura sem título acadêmico), não
regressara de mãos vazias: ao seu ardor juvenil se juntavam agora novos
conhecimentos e muita disposição para a literatura.
Voltou a visitar a Europa em várias ocasiões. Esteve também no Japão e nos Estados Unidos.
Aceitou
o grau de nobreza inglesa, em 1915, mas a ele chegou a renunciar, em
sinal de protesto aos métodos empregados pelos ingleses na repressão de
distúrbios verificados no Punjab. No exato momento em que seu país, sob a
liderança de seu grande amigo, o Mahatma Gandhi, lutava pela libertação
do jugo inglês, Tagore pregava a harmonia e o respeito entre os povos,
concitando-os a criarem um órgão onde o saber e a boa-vontade haveriam
de triunfar, unindo todas as raças e credos. Condenava a escravização
imposta pelas nações fortes e recriminava a agressividade do Ocidente,
mas, imparcial em seus pontos de vista, não poupava seu próprio povo da
recriminação, ao vê-lo enveredar por caminhos perigosos, empolgado por
excessos de nacionalismo. Num de seus discursos disse:
"Tudo
que é grande e verdadeiro na humanidade está à nossa porta, como um
hóspede pronto para ser convidado. Não lhe devemos perguntar de que país
vem; devemos apenas acolhê-lo e oferecer-lhe o que possuímos de
melhor."
Uma
das grandes figuras da humanidade, verdadeiro gênio e profeta, Tagore
desencarnou a 7 de agosto de 1941, na avançada idade de 80 anos, vividos
quase que inteiramente para o aperfeiçoamento moral e cultural da
humanidade.
Nelson Afonso Grupo Editorial Spiritvs, 1965.
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